sábado, 28 de abril de 2012

CARTA A FERNANDO PESSOA

Porto, 29 de Abril de 2012




Meu querido imortal,
estou sentada num café, apesar de não beber café.
bebo comportamentos, bebo diálogos, bebo estilos, bebo discussões, bebo olhares.
e bebo chá.
como tu dizias...
 ("As vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido.")
eu agradeço a minha existência e agradeço ao vento por conseguir senti-lo nos meus cabelos, e nas páginas soltas em cima da mesa.
(" Para viajar basta existir.")
Eras de facto um ser brilhante, quero acreditar que ainda és, mas num outro estado, talvez líquido porque gostavas do mar.
Para viajar basta saber ler-te, podemos em ti conhecer dezenas de mundos, de desejos, de medos, de dores e sem sair da mesma página podemos agradecer por existir alguém que bastou para memória da literatura portuguesa.
(" Tenho em mim todos os sonhos do mundo")
e eu também os tenho, como se eu fosse uma reprodução tua em versão feminina.
viste-me crescer como se fosses meu pai.
aceitei todos os teus conselhos e permiti-me sonhar, como tu.
ensinaste-me que ("Ler é sonhar pela mão de outrem. Ler mal e por alto é libertar-nos da mão que nos conduz. A superficialidade na erudição é o melhor modo de ler bem e ser profundo.")
e eu li, a ti a uma quantidade absurda de génios portugueses.
escritores, poetas, poetisas e Deuses da literatura, como Dante, Homero e Camões.
Quando percebi que queria escrever disseste-me:
-"Nenhum livro para crianças deve ser escrito para crianças."
nunca escrevi livros para crianças, mas talvez um dia escreva.

Quando me senti apaixonada pela primeira vez sussurraste:
-" Podemos morrer se apenas amámos." - primeiro não acreditei, mas depois morri.
Quando morreu a minha mãe o meu mundo desabou, e tu permitiste que te ouvisse e disseste-me "Possuir é perder. Sentir sem possuir é guardar, porque é extrair de uma coisa a sua essência.".
Sento-me tantas vezes aqui, penso, que seria de mim sem ti?
E quase te ouço dizer : "Eu sou aquilo que perdi."

Obrigada meu bom amigo, por me acompanhares desde que aprendi a ler.
Se me respondesses seria tão simplesmente :" Um dia de chuva é tão belo como um dia de sol.
Ambos existem; cada um como é."

Obrigada Fernando Pessoa, pelos audazes e sábios conselhos

Com saudades, "Tudo vale a pena quando a alma não é pequena"

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